quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Meras palavras...

Fecho os olhos, imagino-me numa ilha paradisíaca onde tudo é perfeito, onde as águas límpidas do oceano reflectem a pureza da humanidade…e depois acordo. Às vezes gosto de imaginar que estou num lugar assim, onde posso ser apenas eu sem artefactos e floreados.

Quando somos crianças pensamos que tudo é fácil e que o mundo lá fora nos espera de braços abertos. Mas quando crescemos e nos tornamos jovens adultos deparamo-nos com uma realidade completamente distorcida. E a ideia que tínhamos do mundo encantado é completamente destruída. No entanto pergunto-me, este mundo tem o direito de nos moldar à sua imagem? Não, mas molda sem dó nem piedade. Até podemos continuar a ser puros e verdadeiros mas mais tarde ou mais cedo essa nossa sinceridade vai ser usada contra nós. É nestes momentos que pensamos se vale a pena dizermos tudo o que nos vai na real gana. Na verdade é que nem sempre as nossas palavras têm a interpretação mais digna.

Quando começamos a trabalhar pela primeira vez tudo é novidade, mesmo que não seja o nosso emprego de sonho damos o melhor de nós. Mas com o tempo vêem as desilusões, as incertezas, as frustrações e até mesmo a queda das expectativas . Depois de batermos bem lá no fundo é hora de levantar a cabeça e continuar a caminhar.

Ainda me lembro da minha entrevista, completamente surreal, mas a formação foi fantástica e o espírito de equipa foi notável. E passado um ano e meio, lá estamos nós (mais um menos um) companheiros de luta, sempre prontos para mais um obstáculo. Porém é esta luta que me preocupa. Todos os dias me debato com os problemas dos Call Center (garanto-vos que não é apenas aqui no blog), esquecendo mesmo o meu papel de simples Operadora. Continuo espontânea, e por vezes não penso nas consequências das minhas palavras…digo o que tenho a dizer sem receios das penalizações. Mas quando paro para pensar…receio os efeitos de todas as minhas observações.

Será que na verdade estou a defender os interesses e bem-estar da minha equipa, ou estou apenas a descarregar as frustrações de uma socióloga transformada em operadora? A resposta é fácil quando nos entregamos totalmente aquilo que fazemos...

Até breve!

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Soluções Práticas


As Empresas de Call Center passam grande parte do seu tempo a criar soluções para rentabilizar o tempo dos Operadores. É necessário atender o maior número de chamadas num curto espaço de tempo, e não permitir que haja chamadas em espera. Mas quando os operadores não conseguem responder a todas elas são as suas pausas que estão postas em causa. É que apesar de ser um direito assistido nem sempre é possível fazerem o seu descanso merecido. Por isso nada melhor que estas fantásticas cadeiras para evitar as idas desnecessárias ao WC. Acreditem que iria evitar muitas discussões. Que vos parece? Pouco confortável? Naaa…nunca foi!


Até breve!

terça-feira, 27 de outubro de 2009

O Desabafo - Parte II


Hoje fui abordada no meu trabalho por uma colega que afirmou que após a leitura do meu blog sentiu-se deprimida. A primeira ideia que me veio à cabeça é que a minha escrita era de tal forma enfadonha que deixou a pobre rapariga naquele estado. Mas logo voltei à realidade e percebi que não era a minha escrita que a deixava assim mas o desespero de, ao final de duas semanas de férias, ter de regressar ao trabalho. O facto é que ela identificou-se com o meu blog e, apesar de ser assustadora a sua primeira observação, sinto-me lisonjeada por conseguir que as pessoas se revejam nele.

O acontecimento que descrevi no post anterior não foi um acto isolado, pois todos nós, sejamos operadores de call center ou qualquer outro profissional ligado ao atendimento ao público, já sentimos na pele a frustração de não poder responder a alguém que nos está a humilhar. É horrível esta sensação de impotência, de saber que não se pode elevar a voz para chamar atenção daquele indivíduo que se esqueceu com quem é que estava realmente a falar.
Mas sinceramente gosto de pensar que aquele ser que está do outro lado da linha é alguém bastante mais infeliz do que eu, alguém que se esconde cobardemente por detrás de um telefone e insulta aquele que lhe parece mais fraco. É fácil descarregar toda a nossa frustração numa pessoa que não se conhece, que não se pode manifestar…é tão fácil dizer tudo o que nos vai na alma sem receio de sofrer represálias, pois por mais que digam o cliente terá sempre razão. Mas agora imaginem se nós operadores davamos o grito do Ipiranga e começavamos a responder a todas as ofensas que nos são feitas. O mais certo era ir tudo para “olho da rua”, e as empresas fariam novos processos de recrutamento pois existem cerca de 500 mil desempregados para assumirem o lugar. Não parece que fosse uma decisão muito difícil.

No outro dia ouvi uma ideia que vos
garanto que iria ajudar os operadores a ultrapassarem rapidamente estas chamadas. Como é óbvio não vou ultrapassar os direitos de autor, mas tenho que partilhar convosco esta solução. Imaginem a vossa empresa contratar alguém só para servir de saco de pancada, uma pessoa sempre disponível para receber de bom grado os vossos ataques de raiva, e que no final ainda agradecia. Fantástico. E para tornar a situação mais realista, a pessoa em causa tinha consigo uma gravação do cliente que nos massacrou durante alguns minutos ao telefone. Brutal! Bem eu sei que parece um pouco Sado, e que posso ser acusada de ofender a Declaração Universal dos Direitos Humanos…mas acreditem que às vezes dá vontade. Bem…mas também podem trocar a pessoa por um robô, assim sempre ficava mais parecido com um operador de Call Center. Que vos parece? Acho que vou propor esta iniciativa à minha empresa…haveria certamente menos operadores stressados.

Agora a sério, a vida de um operador não é fácil, é complexa, ingrata e mal paga. Mas não vale a pena renegarmos a nossa situação actual, nem nos deprimirmos, pois é altura de encararmos esta fase como uma passagem e tirar partido de todas estas experiencias. Não somos mais nem menos que os outros, somos profissionais competentes e capazes de levar uma empresa ao sucesso….e disso não tenham dúvidas. Pode é não haver oportunidades…mas isso é uma questão para mais tarde.

Até breve!

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

O Desabafo - Parte I


Hoje tenho que desabafar…estou possessa. Estou com vontade de chamar nomes a alguém. A Alguém não, a uma cliente específica. Quero gritar, ofender e se fosse possível até esbofetear…bem tenho deixar de exageros. Mas é completamente surreal…estou ali sete horas ao telefone a desdobrar-me para poder ajudar os clientes a resolverem os seus problemas…e depois aparece-me uma senhora aparentemente educada mas que no final ameaça que vou perder o meu ordenado. Acham isto normal? Eu ganho 500euros e trabalho num call center, será que ela achava que estava a falar com alguém relativamente influente. Sim porque a forma como a senhora me atacou até parece que eu tinha o poder de resolver o problema em tempo recorde. Tudo bem que ela tem ligado algumas vezes e a pessoa responsável pelo seu processo não tem estado inteiramente disponível…mas daí a dizer que nós inventamos tudo para não ajudar, e que somos incompetentes…há limites.


Só para perceberem esta senhora teve um acidente com a “ordinária” da nossa cliente (adjectivo utilizado pela dita senhora para caracterizar a respectiva), que ficou de lhe resolver o problema. Como podem imaginar pouca ou nada fez, e então esta “simpática senhora” é obrigada a mexer os dedinhos se quer o seu veículo reparado. Ah um pormenor, ela não atende números anónimos. Continuando, liga para nós para marcar uma peritagem ao seu veiculo, mas existem problemas no sistema e não é possível encaminhar a chamada. Fica descontente (que todos os males do mundo fosse este). Como é uma pessoa muito ocupada só passado uma semana se lembra de ligar, e à hora de almoço. Pontaria. E lá está a disponível operadora para satisfazer os desejos da sua ouvinte. Expliquei como se ela fosse muito burra porque motivo a minha cara colega não conseguiu resolver o seu problema num contacto anterior, e depois ainda tive de citar umas passagens do livro “call centers para totós” (vai ser a minha próxima criação) para perceber que não estou propriamente na companhia ao lado do seu gestor e muito menos tenho conhecimentos em mecânica para reparar o seu carro. Após uma longa conversa encaminhei a sua situação para o colega para logo que possível a contactasse. O senhor fez o seu trabalho e ligou, dentro do horário da companhia (como é obvio) …mas é verdade a senhora não atende anónimos....e às 16:50 (quando o gestor se mete a milhas) liga novamente a senhora….e o resto podem imaginar. Desde de ameaçar o meu fantástico ordenado, de pôr em causa o meu trabalho…mas o melhor foi ela dizer que nós não merecemos o nosso emprego. Epah desculpem mas merecia uma boa resposta…será que ela tinha noção que estava a falar com alguém que se matou a estudar para estar a trabalhar precariamente num call center onde não passa da cepa torta. Ah e no final dá me ordens precisas para lhe resolver o problema rapidamente, enviar uma carta a dar resposta e desliga-me o telefone na cara.
Santa paciência…eu mereço!


Perdoem-me o desabafo mas tinha de partilhar convosco esta caricata chamada. A conclusão é que nem sempre do outro lado da linha está alguém pronto para nos ouvir.


Até breve!

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

A velha questão...

O que é realmente importante? Sem dúvida que é uma boa questão, para além de nos fazer pensar, demonstra o quanto somos diferentes na forma como definimos as nossas prioridades. Se para alguns de nós é importante evoluir e ser cada vez melhor naquilo que fazemos, mesmo que não estejamos na profissão de sonho, para outros um bom ordenado, o reconhecimento e até desresponsabilização são fundamentais. Mas independentemente daquilo que move cada trabalhador, uma coisa é certa se não houver motivação os trabalhadores serão o maior limite a uma empresa.

Mas sem dúvida que é preciso exigir mais e melhor de uma equipa de operadores que tem como principal objectivo prestar um serviço de qualidade. Como todos os trabalhadores, também nós profissionais do telefone temos regras e normas que têm de ser cumpridas. Não é desculpa usar ordenado ou as más condições contratuais para termos comportamentos menos correctos. No entanto, e após as exigências feitas, não nos é permitido ter uma voz activa no derrubar das barreiras. Não digo que as nossas reclamações não sejam ponto de discussão e até mesmo de análise por quem de direito, mas só quem ouve todos os dias a voz da insatisfação pode perceber a nossa sede de mudança.

Não pretendo derrubar hierarquias, nem motivar uma anarquia. Quero tornar cada vez mais relevante a voz por detrás do headset, quero sentir que somos importantes e que temos oportunidade de ultrapassar fronteiras.

Às vezes penso se estes meus apelos têm sentido…pergunto-me se serão um mal comum ou um devaneio de uma louca que acredita que pode mudar o mundo. Não sei…mas acho que já estou a evoluir, já não apenas a voz mas também a escrita!
Até breve!

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

O que é realmente importante?


É verdade que um operador de contact center não é pago para ser atencioso, simpático ou até mesmo humano com o cliente. É Pago essencialmente para vender um serviço, para ser objectivo e eficaz. Mas não será possível juntar o útil ao agradável? Não é mais fácil cativar o cliente sendo simpático e cortês? Se assim for, mesmo que por lapso ou desconhecimento errar, ninguém o poderá acusar de prepotência ou arrogância.
Enganam-se aqueles que pensam que a prisão à subcontratação nos faz limitados e insensíveis. Não somos produtos inacabados sem identificação…somos sim parte integrante de uma sociedade na era da flexisegurança. Somos actores de um enredo capitalista que nos torna descartáveis. E à semelhança das radionovelas de outros tempos somos intérpretes de uma voz que nos torna impares.


E agora pergunto, o que será realmente importante?



  • Desbobinar discursos padronizados, mas no final do dia sabemos que fomos objectivos e que cumprimos o que está no contrato.

  • Ou vestir a camisola arriscando a nossa espontaneidade, e não deixando de ser eficazes, personalizando cada uma das chamadas.

Mas o que realmente é importante, infelizmente, não depende de nós…

Até breve!

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

“No computer system…No phone service”



Hoje mais do que nunca senti-me verdadeiramente um robot…daqueles que só mexem os olhinhos e que têm meia dúzia de frases gravadas. É que para além de parecer um disco riscado, a dizer sempre a mesma coisa, senti-me completamente inútil.

Como é do conhecimento público as empresas de call center funcionam com base em sistemas informáticos que permitem estar em rede e ter acesso a uma vasta base dados, de outra maneira não seria possível responder de forma tão rápida e eficaz às questões colocadas pelos clientes. O problema é que estes sistemas sofrem várias actualizações, e como são falíveis, às vezes a “máquina” não aguenta. “no computer system…no phone service”. O sistema não trabalha mas os operadores sim…só é pena não terem a sua ferramenta. Mas isso não conta nada, o que interessa é estarem presentes. Mesmo que passem o dia a dizer que existe problemas informáticos e não há previsão para resolução do problema. Acontece que quando dizemos da primeira vez o cliente aceita perfeitamente. Da segunda fica reticente mas compreende. Quando chega ao final do dia e o problema não se resolve, aí “roda a baiana” e ninguém os pára.

É dose. O pior que pode acontecer a um operador é ficar sem sistema informático, para além de não ajudar, os clientes refilam, e passa o dia a “coçar a micose” sem poder sair do seu posto de trabalho. Não seria mais fácil porem uma gravação a dizer “ Caros clientes lamentamos informar mas o sistema informático encontra-se com problemas, pedimos que voltem a contactar mais tarde?"Sei lá qualquer coisa do género, nunca fui muito boa a encontrar as palavras certas. É que de outra forma estão lá uns pobres coitados a levar com cliente irritado que não consegue perceber que as novas tecnologias também falham. E o pior é quando metem na cabeça que querem falar com alguém superior…é que ainda não perceberam que ninguém vai falar com eles. É que “O SISTEMA ESTÁ EM BAIXO, NÃO TEMOS ACESSO A NADA…NÃO PODEMOS AJUDAR!”.

Podem não acreditar mas isto é pior que um dia de trabalho a sério…

Até breve!!

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

"Operadores à beira de um ataque de nervos"



Finalmente em casa! Após um dia cheio de trabalho…o descanso merecido. Começar a semana a este ritmo estonteante é a previsão de cinco dias infernais. As chamadas continuam a cair à velocidade da luz e a falta de pessoal não permite responder adequadamente a todas elas. Se continuar assim acredito que até ao final do ano metade da equipa esteja em casa por baixa psicológica. Estou a exagerar um pouco, mas não tenham dúvidas que as consequências do stress causado por este tipo de actividade têm repercussões no estado mental de qualquer operador.

O trabalho desenvolvido neste sector é caracterizado em grande medida pela rotina, sendo que a maioria dos serviços têm como base tarefas mecanizadas e padronizadas. Para além disso os operadores estão constantemente em posição de conflito com o cliente, onde a falta de formação e de apoio não permite gerir a situação da melhor forma. Deste modo é difícil não associar o stress a este tipo de organização laboral. Pressão, stress e frustração são palavras bem conhecidas pelos operadores de call center, e mesmo que grande parte esteja “calejado”, não está imune a situações de desconforto e conflito. Não podemos esquecer que falamos de seres humanos que têm as suas fragilidades, os seus medos e as suas frustrações. Seria pedir muito a um trabalhador que fosse indiferente a todas as situações que lhes são apresentadas.

Em 2008 saiu uma notícia no Diário de Noticias* que indicava o stress profissional como uma das principais doenças laborais nos próximos 10anos. Segundo o observatório Europeu dos Riscos (dedicado aos riscos psicossociais do trabalho) as mudanças laborais, como as novas tecnologias, a precarização dos contratos, a redução dos trabalhadores e intensificação dos ritmos conduzem a um aumento do número de pessoas afectadas pelo stress. Mais uma vez os call centers aparecem bem representados, sendo considerados um dos sectores mais expostos a esta doença.

Todos nós já enfrentámos situações complicadas, situações que saem fora do nosso controlo, e situações que nos fazem perder a cabeça. Agora imaginem lidar constantemente com pessoas que vos deixam “os cabelos em pé”, chegarem ao final do mês e terem pouco mais do ordenado mínimo e ainda por cima saberem que o vosso esforço não vai sair daqueles headsets. Não se sentiam deveras stressados? Não admira que ande por aí muita gente a cair de pontes e a das janelas dos gabinetes, e até a perfurar a barriga em plena reunião laboral.
Não quero ferir susceptibilidades, estou apenas a brincar, até porque estamos a falar de assuntos bastante sérios. Temos sido bombardeados nos últimos tempos pela depressão instaurada na France Telecom onde em 18 meses já houve 24 suicídios devido ao plano de reestruturação desta empresa. Vários trabalhadores foram transferidos para outros departamentos devido supressão das suas funções, outros despedidos e outros viram a sua reforma antecipada. Mas o mais grave é o clima de terror, humilhação e silêncio que os trabalhadores têm vivido, muitos deles agora em centrais de atendimento impostos a ritmos “infernais” e a objectivos “inalcançáveis”.

É obvio que este é um cenário terrível e ainda alheio ao nosso contexto, mas sem dúvida que esta função levada ao extremo conduz a um desgaste psicológico e físico de qualquer trabalhador.


Até Breve!!

sábado, 10 de outubro de 2009

Chaplin de volta aos "Tempos Modernos"


Enquanto relia o post anterior lembrei me de uma imagem fantástica. Tinha que partilhar com vocês. Imaginem o Charles Chaplin, na era actual, a protagonizar a comédia “Tempos Modernos”, que tipo de trabalhador seria ele? Sem dúvida que seria um operador de call centers, só teria de trocar a maquina industrial por um headset e o alicate de apertar por um computador. Quanto aos objectivos seriam basicamente os mesmos: produzir mais em menor tempo possível, da forma mais barata, ter horários estipulados para comer e ir ao wc, e não ter responsabilidade directa na qualidade da sua produção.


Chaplin nos anos 30 quis criticar a "modernidade" e o capitalismo representado pelo modelo de industrialização, onde o operário é engolido pelo poder do capital e perseguido pelas suas ideias revolucionárias. O seu filme focalizou-se na vida da sociedade industrial caracterizada pela produção com base no sistema de linha de montagem e especialização do trabalho. Será que a rodagem deste filme, alterando apenas a função, não voltaria a ser uma critica à nossa sociedade?


Até breve!

terça-feira, 6 de outubro de 2009

"Linha de Chamadas"


“Eu tenho a possibilidade para realizar um trabalho muito melhor. Aqui coloco o piloto automático. (…) É como ser um respondedor automático mas vivo, com personalidade. Nós sentamo-nos e falamos como um robot” .


Estas palavras são tão familiares…Basta fechar os olhos e imaginar que estou novamente naquele cubículo onde não existe sequer uma janela. Onde as nossas vozes se difundem e as nossas inquietações se perdem. De repente, ao fundo surge um sinal, e lá estou eu novamente …Muito bom dia, fala Liliana Ribeiro em que posso ser útil? E do outro lado a esperança de que aquela voz não seja mais um robot, mas alguém humano pronto ajudar.

O excerto apresentado no inicio do post foi retirado de um artigo da revista Sociologia, Problemas e Práticas* que acabei de ler. É realmente um artigo muito interessante, que para além de falar da organização laboral dos call centers fala-nos da perspectiva do operador. Mas estejam descansados que não vos vou aborrecer com um resumo intensivo deste texto. Simplesmente gostaria de partilhar convosco alguns apontamentos deste artigo sobre o autor Andrea del Bono e seu livro “Call centers, el Trabajo del Futuro?(2000)"

Este autor faz o paralelismo entre o modelo organizacional dos call centers e o trabalho taylorista. Através da sua investigação identificou algumas analogias com o modelo clássico de organização do trabalho, principalmente na alienação sentida pelos operadores. É verdade que os tempos são outros e a conjuntura actual difere de outrora, mas é possível que trabalhadores qualificados sintam alienação, pois a cada dia que passa vêem os seus projectos de vida adiados e encaram o seu trabalho unicamente como fonte de rendimento. Existe maior alienação que esta? É certo que nos primórdios do século XX as oportunidades eram mais restritas, mas e agora, que temos nós jovens licenciados? Temos um leque de ofertas precárias que nos obriga a trabalhar um número ínfimo de horas, sujeitos a um ordenado misericordioso e sem qualquer possibilidade de progressão.

Cada vez que penso na questão lançada por Bono, parece-me que faz mais sentido. O taylorismo não era se não um sistema de organização do trabalho baseado na divisão de tarefas, cuja execução das mesmas eram previamente estudadas e planeadas em função do menor tempo de produção? Os operadores também não têm o tempo contado e não existem estratégias para atender o maior número de chamadas em menos tempo? Em prol da eficiência há que racionalizar as chamadas e submeter o operador a uma apertada cronometragem. A realidade muda mas o conceito permanece…

“Os operadores de call center são trabalhadores com uma cadeia de montagem na cabeça” (Bono, 2000). Com esta me despeço;)

* SANTOS, Maria João; MARQUES, Ana Paula - "O caso dos call centers: organização do trabalho e atitudes face ao trabalho e emprego". Sociologia, Problemas e Práticas. Lisboa. ISSN 0873-6529. Nº 52 (2006).

Até breve!!

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

A Escravatura dos Tempos Modernos


A precariedade é um fenómeno mundial que ultrapassa todas as fronteiras, que entra nas nossas casas sem bater à porta e penetra nas nossas vidas sem pedir permissão. É a epidemia do século XXI, que não se comparando com a época da escravidão trás frustração e sofrimento a muitas famílias. A precariedade está agora a alastrar a toda uma geração de canudo que vê os seus sonhos destruídos e o seu futuro adiado, e todos os dias ao levantar pergunta quando chegará a vacina que nos vai curar desta doença social a que nenhum de nós está imune.

Apesar de esta realidade ser aceite mundialmente, existem países onde o call center se assemelha à escravidão. Exemplo disso é a exploração feita aos funcionários de call center na Alemanha. Para além de um operador permanecer no emprego por apenas um período de ano e meio, onde é demitido ou “obrigado” a pedir demissão, é considerado uma máquina pois está ali para funcionar e não para ter direitos. Para não falar dos ordenados, pois ganham menos do ordenado mínimo e não vêem o seu rendimento aumentado se trabalharem ao fim-de-semana.

É verdade que na época da escravatura eles não eram propriamente despedidos, a despedida era mais da terra dos vivos, pois eram mortos de imediato caso não servissem para a função. Segundo a wikipédia a “escravidão é a prática social em que um ser humano tem direitos de propriedade sobre outro designado por escravo, ao qual é imposta tal condição por meio da força”. O que somos nós, se não escravos deste mercado actual. Não seremos certamente de um senhor mas somos de certeza de uma máquina capitalista que nos obriga a trabalhar em condições precárias para podermos sobreviver a toda a esta epidemia.

Para conhecerem um pouco mais a realidade dos Call Centers na Alemanha vejam este artigo:
http://www.portugaldigital.com.br/noticia.kmf?cod=8936039&indice=0&canal=159

Até breve!!

domingo, 4 de outubro de 2009

"Tempo de mudarmos"




Bom dia Pessoal!

Desde já gostava de pedir desculpa a quem segue este espaço por nestes dois dias não ter acrescentado nada ao blog. A verdade é que estava realmente de rastos, e acho que ainda não recuperei na totalidade. Estas duas últimas semanas têm sido muito desgastantes, não só por estar bastante empenhada no blog, mas principalmente porque no meu trabalho tem sido um caos. Para além do aumento do fluxo de trabalho, devido alterações no encaminhamento de chamadas para CC, a assiduidade dos operadores não tem ajudado muito.

Na minha opinião a abstenção é um dos grandes problemas dos call centers. Os funcionários ao darem pouca importância à função que desempenham, não consideram a assiduidade como característica de um bom operador. Penso que existe uma desresponsabilização por parte destes, não só pelos grandes níveis de abstenção, mas essencialmente por não haver a preocupação de avisar os seus superiores que vão faltar. Prejudicando assim toda uma equipa. É obvio que todos nós temos problemas, todos nós ficamos doentes e que em determinada altura estamos impossibilitados de nos deslocarmos para o emprego, mas será que por vezes não nos acomodamos à nossa posição e faltamos porque simplesmente não nos apetece ir. Acreditem que não estou aqui para criticar ninguém, simplesmente questiono o motivo que leva a níveis de abstenção tão elevados.

Se nós já somos praticamente descartáveis, porquê tornar a tarefa de quem dirige ainda mais fácil?

Eu sei que a motivação dos funcionários não tem sido um objectivo da maioria das empresas, e que o rendimento mensal também não ajuda. Mas será que faltando mostramos o nosso descontentamento? Ou estamos simplesmente a reduzir ainda mais o nosso salário? E o prémio que tem sempre o parâmetro da assiduidade, não é tido em conta?
Somos uma classe de trabalhadores descartáveis, é um facto, mas também cabe a nós mudarmos isso, mostrando que temos qualidades e que somos bons naquilo que fazemos. Vamos dizer basta a esta sociedade capitalista que faz de nós jovens e velhos “carne para canhão”, que nos torna trabalhadores intermitentes com salários baixos e sem progressão. Vamos partir para a luta mas com moral, com convicção que somos bons trabalhadores capazes de dignificarmos uma empresa.

Um desabafo….
Até breve!

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Encontrei a agulha no palheiro (ou não)!




Finalmente encontrei o sindicato. Quem diria que havia alguma entidade interessada em defender pessoas que a única coisa que sabem fazer é falar ao telefone. As siglas do sindicato são facilmente identificáveis, como não pensei nisto antes. Não me digam que nunca ouviram falar do SINTTAV, eu cá sinto-me completamente envergonhada. Como se pode criar um blog a falar de call centers e não estar tão-pouco inscrita no sindicato. Assumo publicamente que desconhecia completamente tal entidade. Mas nada que uma boa pesquisa na internet não resolva.

Então para que saibam o SINTTAV é o Sindicato Nacional dos Trabalhadores das Telecomunicações e Audiovisual, “ (…) cuja abrangência dos seus Estatutos permite sindicalizar e defender os trabalhadores de todo este grande sector da actividade ainda em expansão”. Já vos diz alguma coisa? Ou nem por isso? Não é fácil, porque até eu que estou atenta a estas questões só descobri depois de ler muita coisa. Continuando, o “SINTTAV está implantado num conjunto de empresas muito grande, desde as empresas Telecomunicações tradicionais à Telefonia Móvel, Televisão tradicional e por Cabo, Rádio, Multimédia, Actividade Cinematográfica, Comunicações, Organismos do Estado ligados à actividade do sector, Empresas Prestadoras de Serviços para o sector, bem assim como empresas de actividades afins ou complementares, independentemente do seu carácter jurídico ser público ou privado”.

Bem digamos que esta apresentação no site não está muito clara, o que me levou a pesquisar um pouco mais. Até que cheguei aos verdadeiros objectivos deste sindicato, “(…) defender os seus associados em particular e os trabalhadores do sector em geral, através de uma intervenção diversificada e qualificada nas diversas vertentes da sociedade, para que os trabalhadores tenham um amanhã mais risonho, com mais e melhor qualidade de vida, com salários mais dignos e justos, com melhores direitos laborais e sociais, com sistemas de carreiras mais motivadores e também dispondo de um rede diversificada de benefícios extra contratuais”. Isto não é o que todos queremos, melhores condições de trabalho e salários mais justos? Bem, não quero parecer céptica mas a verdade é que para defender os Call Centers é necessário conhecer a realidade. E pelo que verifiquei o SINTTAV abrange muito mais áreas do que este sector, e trabalha essencialmente junto de grandes empresas, deixando as empresas de outsourcing um pouco à margem do seu objectivo.

No entanto, acho sem dúvida que este é um ponto de partida para a criação de um movimento de apoio e defesa dos colaboradores das “centrais telefónicas”. E não estou só a falar de melhores condições, porque este é um objectivo adquirido, é essencialmente para credibilizar a classe e combater as desigualdades e injustiças laborais.


Vejam o site do SINTTAV ( http://www.sinttav.org/ ) e deixem o vosso comentário.


Até breve!